O ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, em mais de um seus momentos de inspiração andou por aí divulgando sua proposta para reverter uma das maiores barbaridades ambientais já feitas no Brasil. Recentemente, alguns jornais publicaram uma proposta de Minc para reduzir em 12 metros a profundidade do reservatório da hidrelétrica de Balbina, no Amazonas, para permitir a regeneração de mil quilômetros quadrados de floresta.
A usina de Balbina, que começou a ser construída na década de 1970 e foi inaugurada em 1989, alagou centenas de quilômetros quadrados de floresta amazônica e deslocou comunidades de índios Atroari que viviam em áreas hoje submersas. Isso tudo para ter uma capacidade baixa, próxima dos 250 MW, e para produzir, em média, 120 MW de energia para a cidade de Manaus. A situação foi ainda agravada pelo projeto mal feito que optou afogar as árvores em vez de cortá-las o que criou um verdadeiro cemitério aquático com centenas de estacas no meio da água e milhões de toneladas de emissão de metano.
Se para o ministro reduzir o lago parece ser uma boa alternativa à natureza, o caso não é tão simples. “Haverá uma recuperação, mas a área nunca será como a original. A abundância e composição das espécies, a complexidade de ecossistemas e relações tróficas jamais serão as mesmas. Recuperar é fácil, difícil é regenerar”, afirma biólogo Bruno Cascardo, chefe-adjunto da Reserva Biológica de Uatumã, criada no início dos anos 90 como uma das medidas de mitigação pelos impactos de Balbina. A unidade de conservação recebe hoje cerca de um milhão de reais referentes à compensação ambiental paga pela Amazonas Energia. Estudos feitos pelo Programa de Grande Escala da Biosfera-Atmosfera da Amazônia (LBA), desenvolvido pelo Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), podem esclarecer viabilidade de reduzir o tamalho do lago da hidrelétrica. Estes estudos avaliaram as emissões de metano e alternativas para reduzir os impactos ambientais da usina.
Metano nas turbinas
De acordo com cálculos feitos em 2005 pelo biólogo do LBA Alexandre Kemenes, as emissões de metano do lago e do rio abaixo da barragem somam o equivalente a 73 mil toneladas de carbono. Para comparação, esta quantidade equivale a entre 5 e 10% das emissões anuais com a queima de combustíveis fósseis na cidade de São Paulo. É bom destacar que o metano, devido a características moleculares que absorvem mais calor, é 25 vezes pior para o aquecimento global do que o dióxido de carbono, segundo o pesquisador.
Além disto, um modelo matemático desenvolvido pelo Kemenes indica que a redução de 12 metros no nível do lago inviabilizaria a produção de energia elétrica.Durante seu doutorado, Alexandre Kemenes navegou 4 mil quilômetros em um bote a motor (voadeira), equipado com um sonar para medir o fundo do lago da usina e desenvolver uma fórmula que relaciona o nível do reservatório com o tamanho do lago.
O pesquisador estimou o tamaho real do lago de Balbina em 2,6 mil quilômetros quadrados, na cota máxima da usina, 50 metros. Com a redução de 12 metros no nível d'água, a cota cairia para 38 metros, e sobrariam apenas 600 quilômetros quadrados de lago.
Durante os efeitos do fenômeno El Niño de 1997/1998, aquele mesmo que contribuiu para os incêndios em Roraima, a cota de Balbina chegou perto dos 40 metros (dois metros acima do que o pretendido pelo MMA). A usina parou. Para recuperar mil quilômetros quadrados de floresta, bastaria, na verdade, baixar o reservatório em três metros, segundo a fórmula elaborada por Alexandre Kemenes. Mesmo assim, não é uma idéia vista com simpatia pelo pesquisador. "Existem outros lugares com mil quilômetros quadrados de floresta para recuperar e que não geram energia", afirma.
Propaga-se pela região que Manaus poderá contar em breve com energia gerada pelo gás natural e com o Linhão de Tucuruí, portanto, vai depender ainda menos de Balbina. Mas o governo parece não aprender com o passado e outras usinas estão previstas para a Amazônia, além da ampliação dos gasodutos. Investimentos caros, com impactos sociais e ambientais. Para a Amazônia, resta a dúvida de saber o que é menos pior: insistir nas usinas já construídas ou em novos empreendimentos com impactos obscuros.
Kemenes tem outra proposta para Balbina, que poderia ser empregada em outras usinas hidrelétricas na Amazônia: aproveitar o metano que passa pelas turbinas para gerar energia. Balbina poderia ter sua capacidade dobrada com o aproveitamento do gás, segundo o cientista. Com a vantagem de não precisar abrir caminho na floresta para novas linhas de transmissão.
FONTE (O ECO)
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